É difícil, eu sei. Talvez você ainda não tenha se dado conta de tudo, mas sim, veio uma derrota. Aqueles anos de trabalho duro, noites mal dormidas e sacrifícios que só quem ocupa essa cadeira conhece… tudo isso parece ter sido ignorado. E, para piorar, os que ontem apertaram sua mão com entusiasmo e te chamaram de “líder” já ensaiam novas palavras, agora direcionadas ao vencedor. É desconcertante, mas é o jogo. É a política.
Mas, prefeito, aqui vai uma verdade que talvez não seja fácil de ouvir: essa sensação de abandono não é só sua. Perder o poder é como perder o palco de uma peça que ainda não terminou. E o que será lembrado não é a sua entrada triunfal ou mesmo os atos do meio. É o último capítulo que molda a lembrança do enredo.
Na política, como no teatro, o público não lembra das primeiras falas; ele sai comentando o ato final. A última impressão é a que fica. É cruel, mas verdadeiro. Você pode ter liderança em avanços importantes, enfrentado crises com coragem e mudanças nos rumores de sua cidade. Mas se os meses finais de sua gestão foram marcados por silêncio ou desordem, o que ficou na memória do eleitor é a sensação de que algo faltou.
E isso não é opinião. A psicologia chama de efeito de recência¹ : o cérebro humano tem um preço desproporcional pelo que viveu por último. É assim com filmes, relacionamentos e, claro, com mandatos políticos. No palco da política, os aplausos — ou vaias — finais definem toda a peça.
Por isso, eu te questiono: como você quer ser lembrado? Como aquele que deixou o palco com dignidade e honra, ou como o que perdeu a chance de dizer adeus da maneira certa? Ainda há tempo para decidir.
Agora que a poeira da eleição está baixa, você começa a enxergar as coisas como elas realmente são. Os que ontem eram “amigos” agora já tomaram café com o novo prefeito. Eles se queixam de como foi difícil trabalhar com você e ensaiam elogios para o próximo ciclo de poder. É amargo, mas também libertador. Você não precisa mais adivinhar quem estava ao seu lado por interesse.
E tem os “engenheiros de obra prontos” , aquelas figuras que aparecem depois do resultado dizendo que sempre sabiam que você perderia. São aqueles que se gabam de ter te alertado — mesmo que, na verdade, nunca o fizeram. Isso se chama viés retrospectivo² , um mecanismo psicológico que faz as pessoas acharem que o passado sempre foi óbvio. Na política, esses “sabichões” estão sempre à espera, esperando o momento de parecerem visionários à custa do esforço dos outros.
Prefeito, você ainda tem uma oportunidade. E não é qualquer oportunidade: é a chance de definir seu legado. Prestar contas não é autopromoção; é uma demonstração de respeito ao cidadão. Apresente os números reais, as conquistas que alcançaram e, sim, os desafios que conquistaram. Se algo deu errado, explique com clareza. Porque, se você não fizer isso, o próximo prefeito fará. E ele fará da forma que mais favorece a narrativa dele — não a sua.
Na nossa região, dois casos recentes mostram como o final de uma gestão pode moldar a percepção pública:
Esses exemplos mostram que o estágio de uma gestão não depende apenas das ações realizadas, mas de como elas são comunicadas. O palco ainda é seu, prefeito. Cabe a você decidir como vai utilizá-lo.
Prefeito, perder uma eleição é difícil. Mas não é o fim. A política, como a vida, é cíclica. O que você fizer agora definirá não apenas como será lembrado, mas se terá uma segunda chance no futuro. Não há atalhos. Sair pela porta da frente exige coragem, estratégia e visão.
O final do seu mandato é mais do que uma despedida. É uma oportunidade de demonstrar que você é um líder que respeita o jogo democrático e que sempre honra o compromisso com a população. Porque, no final das contas, o que fica não é o que foi, mas como termina.
Vamos em Frente.
David Silva, estrategista de marketing e neurocientista, possui 10 vitórias eleitorais. Em 2024, liderou a campanha da vereadora mais votada do PL no Brasil e do 5º candidato a prefeito mais votado em São Paulo.
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